DENOVO E DA MESMA FORMA
O que aconteceu com o Inter no sábado tem nome: tragédia. Um gol, um ponto ou uma vitória, não foi a primeira vez que ocorre tal fato conosco, pelo contrário, foram tantas que até já me faço acostumado. Dessa vez nem o abatimento foi tão grande, como nem tão grande foi o meu pesar. Coisa de quem, lá no fundo, já esperava por isso.
Meio que sem querer encontrei em certos cantos escuros e já quase mofados do meu HD o post acima, e de alguma forma isso contribuiu para enfim contar a respeito da maior conquista do colorado em todos os tempos.
O personagem principal da derrota tão amargurada que cito acima chama-se São Caetano. Os 5 x 0 que eles nos enfiaram naquela malfadada tarde de sábado, tirariam-nos a chance de disputar a Libertadores de 2004 e, conseqüentemente, arruinaria com toda uma bela campanha durante o Brasileirão de 2003. Me lembro de tudo: a noite de sábado nos reservava um casamento e, na companhia de Fernanda, num bar do calçadão de Tramandaí, via meu sonho de assistir meu time disputar a Copa Libertadores da América ir para o espaço de uma forma pra lá de catastrófica. Não imaginava que, passados três anos, assistiria ao que assisti a algumas semanas atrás.
1ª FASE
O ínicio da campanha colorada, o jogo na Venezuela, que foi assistido na casa e companhia de meu amigo, colorado de fé como poucos, Guilherme, parecia o prenuncio de algo que não parecia estar em boas mãos. O gol de empate do Maracaibo aos 43min do 2º tempo, numa falha cruelíssima de nossa defesa, escancarava tudo aquilo que os colorados estavam cansados de assistir; a má sorte, o acaso, o destino conspirando novamente contra.
Não foi por confiança na equipe ou premonição de que estaria assistindo um futuro campeão sul-americano, que fui até o revendedor Sky aqui da cidade, e contratei seus serviços no intuito de assistir ao 2º jogo do Internacional na competição. Com intimidações do tipo “só compro se instalarem a tempo de Inter e Nacional hoje à noite” que me ausentei da loja, deixando cheques que totalizavam R$ 400,00, para mais tarde, a tempo, receber a visita do técnico da TV por assinatura que conseguiu, por pouco diga-se, instalar a antena. O motivo que me fez gastar essa grana foi, acima de tudo, proporcionar ao meu velho o prazer de ver o seu Internacional, denovo, jogando a competição-mór de nosso continente. E isso parece também ter dado sorte. Essa primeira partida, assistida ao lado de meu irmão e meu pai, na salinha de casa, teve uma excelente apresentação colorada, e um placar categórico de 3 x 0.
Após, viria o jogo da meia-noite, e Pumas x Inter acabou sendo um jogaço. A virada com Fernandão e Rentería tiveram um gosto pra lá de especial. Eu e meu velho desligando a TV felizes as duas da matina é algo digno de não ser esquecido.
Hora do returno, e lá vinham os mexicanos novamente. Dessa vez abriram de imediato um inexplicável 0 x 2 em pleno Templo, jogando com uma equipe mista ou mesma reserva, não me lembro bem. Fernandão e Adriano trataram de pôr fim ao absurdo, e os 3 x 2 já aparentavam dar uma amostra do que o futuro nos reservava.
Aí houve o jogo contra o Nacional. Esse parece ter passado desapercebido. Pouco ou quase nada me lembro da mais sem graça de todas as partidas da campanha: um 0 x 0 que assegurou-nos quase que com certeza para a fase seguinte da competição.
Inter 4 x 0 Maracaibo serviu mais como treino do que propriamente para qualquer outra finalidade. A vaga já estava assegurada, só uma desastrosa derrota colorada, seguida de vitória do Nacional, na sua partida contra o Pumas, retiraria o Inter das oitavas. Na realidade, apenas restava saber quem enfrentaríamos na próxima fase.
A boa campanha, 2º lugar geral na competição, fez com que disputássemos as oitavas contra nosso maior algoz sul-americano. Se não cruzássemos contra o Vélez Sarsfield teríamos o direito de decidir todas as disputas em Porto Alegre. O nervosismo iniciava o seu trajeto, tomava seu rumo ladeira acima, mas ainda não indicando que o cume, o topo da montanha era o seu destino.
OITAVAS-DE-FINAL
Jogo fora de casa contra o Nacional. Jornais lembrando a pegajosa final de 1980, o fracasso colorado numa competição que ainda não reunia um pingo do glamour que hoje ostenta. O Inter leva o primeiro numa cobrança de escanteio uruguaio. Estádio pequeno, pressão, e o Inter escapando de levar o segundo até que... até que há uma falta... e até que enfim o colorado possui no elenco quem cobre-as: Jorge Wagner iguala o marcador a poucos minutos do fim do 1º tempo de forma esplêndida, e o sufoco ameniza para o intervalo, a respiração torna-se novamente viável na sua plenitude. Voltam às equipes, o jogo recomeça e eu assisto, a não sei direito que altura do jogo, ao mais espetacular gol do Internacional na competição: o peladeiro Rentería recebe uma bola de Fernandão de cabeça. O colombiano domina no peito, com o pé direito aplica o maior chapeuzinho que eu já vi numa transmissão ao vivo pela TV, e desfere, sem deixar a bola tocar o solo, com o pé esquerdo, um tiro certeiro, no angulo, que estufa a rede charrua e decreta o 1 x 2 no placar. O Inter acabaria o jogo com dois jogadores a menos: Rentería e Ediglê, este, que entrou apenas para dar um pontapé grosseiro na lateral e receber um até breve de Oscar Ruiz. Era a primeira aparição do ferrolho colorado; uma barreira quase instransponível nos arredores da meta colorada que não permitiu o gol de empate até os 50min do 2º tempo.
O jogo de volta foi chato. O Nacional até gol mal anulado teve, mas não adiantava ao time uruguaio mais nada. O 2º gol de Rentería proporcionou ao Inter muito mais que uma imensa vantagem para o jogo de volta. A supremacia colorada era evidente e isso não poderia ser desmanchado pela canhestra equipe do Nacional. O futuro do Inter na competição, vingaria a equipe que foi derrotada por esse clube em 80. Mal imaginava Rentería, que no gol de placa que ele assinalou naquele arremedo de estádio no Uruguai, estava vingando toda uma geração que por anos foi perseguida pela derrota de 1 a 0 no estádio Centenário, 26 anos atrás.
QUARTAS-DE-FINAL
A altitude e mais do que ela, o temor: a LDU representava o desafio máximo para o Inter até o momento. Era certo que teria de ser despendido muito esforço, muita bravura, muito futebol para superar os equatorianos. Me lembro bem: eu, o muy colorado Bija, meu pai e meu irmão assistimos o primeiro tempo juntos na sala. O Inter inicia jogando bem, não se amedronta e acaba o 1º tempo vencendo com um golaço de fora da área, do melhor lateral esquerdo das Américas, Jorge Wagner. Lamentavelmente, por incrível que possa parecer, nessa partida não havia Clemer. No seu lugar havia Marcelo e o medo de sair nas bolas que eram levantadas para a grande área. No segundo tempo meu pai se ausentou, foi até a cozinha fazer sua comida, e parece ter levado consigo a sorte colorada. O placar de 2 x 1 em prol dos equatorianos ao término do embate foi um verdadeiro câncer, que por mais que não possa ter sido considerado um mal resultado, nós venciamos a partida até a metade do 2º tempo, e o jogo de volta ocorreria após a malfadada Copa do Mundo, ou seja, quase 2 meses depois. Tempo o suficiente para não me fazer esquecer os equatorianos e a sua virada durante muito tempo.
E o tempo foi passando, a competição da FIFA se desenrolando, os jogadores retornando de uma espécie de mini-férias, e tudo começava a cheirar, cada vez mais forte, parecia que em todo lugar, LDU.
Chegou à data, 18 ou 19 de julho, não me recordo com toda a certeza. Dessa vez Bija, meu pai e eu assistíamos a tudo da 29 polegadas da sala, enquanto meu irmão preferiu por assistir o histórico embate no seu quarto. Passado o primeiro tempo de muito sofrimento, com o Inter jogando melhor, não permitindo a LDU nenhuma chance de maior perigo, tive de dar uma de taxista e levar minha mãe até um compromisso dela para com causas sociais. Louvável ela e sua atitude de atuar em prol do beneficio humano, da causa humana. Louvável, porém gremista, e por isso tive de vislumbrar o sua secação ao chegar em frente ao bar mais movimentado da cidade naquele instante e vislumbrar de relance meu amigo Estevo, o Mr. Guadalajara, igualmente gremista. Parei para lhe desferir um aceno e vi estampado no rosto dele e dela a vontade de que a tentativa colorada se mostrasse infrutífera. Vi estampado o semblante de quem estava torcendo contra e, por Deus, que horror foi aquilo! Haviam ainda 45 minutos e o Inter tinha de conseguir. O placar atual nos desclassificava do restante da competição. O sonho morreria se nada ocorresse nos 45 minutos finais.
Voltei pra casa a tempo de não perder sequer um minuto da partida. O abençoado Rafael, aos 7min, recebe a bola e em chamas parte para cima da defesa equatoriana. Pra cima, babando pra cima dos equatorianos, pra lá, pra cá, até chutar forte no canto direito do goleiro da seleção do Equador e fazer com que eu desferisse um imenso grito de “bucha”, que arruinou as minhas cordas vocais no dia seguinte. Sentado, no sofazinho de casa, com uma cuia na mão, vi Rafael Sóbis começar a escrever o seu nome na história do Internacional no mais emblemático jogo da campanha colorada na Libertadores. O segundo gol, de Rentería, e a fan-tás-ti-ca defesa de Clemer no último minuto, impedindo a definição da vaga nos pênaltis, pareciam deixar claro que a aspiração colorada era, definitivamente, o título.
SEMI-FINAIS
Após 17 anos, novamente em Assunção, contra um time que vestia as cores preto e cinza, o Internacional decidiria uma vaga a final da Libertadores. Não me recordo de nada da partida de 89, mas só eu sei como me escondi, e tratei de ficar longe quando qualquer coisa daquela trágica e horripilante partida contra o Olímpia era referida, seja no rádio, seja na televisão, seja por bocas de terceiros. Bom, lá ia o Inter novamente para o Defensores Del Chaco, dessa vez enfrentar o time que havia, na fase anterior, retirado o River Plate da competição. O jogo reuniu sintomas cada vez mais claros de que 2006 poderia sim ser o ano. Foi uma partida guerreada, viril e com lances para ambos os lados, mas nenhuma chance, nenhuma oportunidade chamou mais a atenção do que a primeira e, principal e espetacularmente, a segunda bola na trave da equipe paraguaia. Transcrevo abaixo, palavras que postei no já finado blog sobre futebol que por 2 meses, ou quase isso, mantive na companhia de meu comparsa, colorado ilustríssimo, Cleyton:
Não vimos o mesmo Inter que enfrentou a LDU. Tão pouco poderiamos, pois primeiro, o jogo não era em casa, e segundo, não tinhamos Tinga e Granja, que junto com Wagner e Sóbis formam o quarteto fundamental da equipe. O jogo foi interessante, bastante guerreado, viril mas não desleal. Jogadores como Fernandão, Sóbis e Wagner destoaram positivamente, Edinho, sozinho, destoou muito negativamente.
O que chama a atenção, é que há algo de diferente dessa vez, há uma sorte/força que está do nosso lado, atuando EM favor, caso contrário, o Internacional não teria saído de Assunção com esse bom 0 x 0.
Se não, vejamos:
1º tempo; após a bola colidir na trave direita de Clemer, sobrar para um jogador do Libertad que, na ponta esquerda, ingressou na grande area e cruzou para que quase na pequena area um avante da equipe paraguaia chutasse torto na bola e ela fosse parar nas mãos do goleiro colorado.
2º tempo, lá pelos 40min a bola sobra para um jogador do Libertad que, da intermediária, um pouco distante da meia lua da grande area, desfere um tirambaço na bola que, após chocar-se contra a trave, bate nas pernas e após nas costas de Clemer para, inexplicavelmente, ir para a linha de fundo.
Fosse em qualquer outra oportunidade da história recente do time da Beira-Rio, as duas bolas entrariam. Se não a primeira, segura e certamente a segunda. E é dessa forma que o sonho continua firme e forte.
No jogo de volta eu estava lá. Na companhia de outro magnífico colorado, Beto, parti para o Gigante, tomando um vinho na viagem, assistindo a um estupendo pôr-do-sol e no meio do caminho ainda pisando nas areias de Imbé, numa mudança de rota absolutamente inusitada. E foi de lá do Bêra, abarrotado, lindo, que liguei para meu pai e disse a ele que “o circo estava montado”. Não sei se me expressei como queria. Acho que o que almejava era dizer algo como “o palco estava montado” ou “o palco estava pronto”, mas o nervosismo e o vinho da tarde estavam mandando a conta. Na única partida que ousei deixar minha residência e o conforto da sala, do chimarrão e da companhia de meu pai e de Bija, vi o Inter vencer o Libertad por dois tentos a zero, num jogo dificílimo, recheado de oportunidades paraguaias, felizmente, todas elas, impressionantemente desperdiçadas, bem na minha frente, pelos avantes guaranis. Aos 10min do segundo tempo, parecia que, caso o Divino não intercedesse, e rápido, iríamos dizer adeus mais uma vez.
Disse algumas linhas acima que 2006 poderia ser, enfim, o ano. Pois é, quando tudo parecia complicar-se de forma irremediavel, num angulo de visão privilegiadíssimo, assisti a Alex, lá do outro lado do campo, de perna esquerda colocar o Internacional, depois de 26 anos, na sua segunda final de Libertadores. Em meio a explosão, estava eu pulando em cima do místico cimento do Beira-Rio, subindo e descendo degraus no meio da euforia que se instaurou, gritando “estufou, estufou”, num surto só meu, de quem estava ali vendo o colorado ir adiante. O sonho mantinha-se cada vez maior e mais próximo. Fernandão, com a perna direita, fez o segundo e selou o que o destino parecia querer: o Internacional seria o adversário do São Paulo, atual campeão, classificado no dia anterior ao vencer o Chivas Guadalajara por 3 x 0, no mais importante torneio das Américas e não, eu não estava preparado para tamanha aflição/nervosismo/angustia/terror/etc que consumiria com o meu emocional pelas próximas 2 semanas.
FINAIS
Fugi de jornais e noticias tão logo o jogo contra o Libertad findou-se. Reconheço que após os 2 x 0 contra a LDU teve ínicio a tentativa (suficientemente exitosa, diga-se, realizando agora um balanço geral) do auto-implantado desapego às informações acerca do Internacional e tudo que envolvia as partidas. O ápice dessa empreitada ocorreu logo após a partida contra o Libertad, como eu dizia. Não poderei conceber um comportamento igual da minha pessoa em qualquer outra oportunidade. Eu estava absolutamente ausente para diálogos acerca do jogo, excetuando-se pessoas muitíssimo próximas quando o assunto é futebol; Guilherme, Bija, Cleyton e pouquíssimos outros eram os únicos com quem me atrevia a dialogar. Adoraria poder hoje ouvir o que se dizia nos programas esportivos, principalmente o que Cláudio Cabral, Hugo Amorim, Kenny Braga afirmavam naqueles dias. Lamentavelmente, naqueles mesmos dias, não reunia condições mínimas para tanto. Sabia que se não me mantivesse distante disso tudo, poderia muito bem arruinar com o pingo de sensatez que ainda possuía. Foram dias difíceis.
Uma noite que iniciou quente e terminou chuvosa e fria, assim foi o 9 de agosto, dia que assisti a superioridade são-paulina, dita e afirmada por todos os cantos, se esvair pelo ralo. O grande culpado disso, responde pelo nome de Rafael Sóbis, e o que ele fez no Morumbi foi INESQUECÍVEL. Deveriam levantar um busto desse rapaz no hall de entrada do estádio. Como essa idéia não possui chances de ir em frente, ao menos prestei uma merecidíssima homenagem a ele, colocando um pequeno quadro seu em minha mini residência. A inscrição Monstro que digitei ao seu lado numa imagem capturada após o gol contra a LDU demonstram, fidedignamente, o que o agora jogador do Bétis encarnou no maior gramado do estado paulista. Rafael Sóbis foi um monstro contra o São Paulo, especialmente lá, silenciando perto de 70.000 torcedores tricolores. No momento em que recebeu em velocidade uma bola de Edinho e arrastou consigo a zaga do São Paulo, Sóbis levava consigo os sei lá quantos milhões de colorados espalhados pelo mundo na sua garupa. Quando fez troça de Fabão no bico da grande área e trôpego desferiu um tiro indefensável no canto direito da meta de Rogério Ceni levou a nação vermelha aquela espécie de delírio que foge da compreensão, e da possibilidade de transcrição em forma de palavras.
A maior imagem desse jogo, e uma das maiores da trajetória colorada nesse iluminado ano, tem ao fundo, junto de uma desfocada e estupefata torcida são-paulina, a placa lembrando o título que o colorado estava conquistando, e ele, Sóbis, no centro da foto, em meio a sua corrida posterior ao 1º gol, com ambos os pés no espaço, distantes da grama, como se o mesmo possuísse asas, como se fosse ele o anjo colorado daquele magistral 09 de agosto.
A bola na trave de Tinga e a posterior conclusão de Rafael para o fundo das redes no segundo gol, mostrava a todos ao o que, especificamente, estava disposto o Internacional. Desde o inicio não nos propúnhamos a meros figurantes. O gol são-paulino de Ed Carlos fazia parte de uma aceitável reação, visto que estavam em seu estádio e a pressão era imensa. Ainda assim, o mesmo ferrolho que deu sua primeira amostra no jogo pelas oitavas-de-final contra o Nacional no Uruguai, retornava, não permitindo que nos últimos 15 minutos o time paulista chegasse ao empate.
A quinta-feira seguinte iniciou um dos mais perturbadores períodos de minha vida. A reclusão, e a não audição ou leitura de qualquer coisa com relação ao jogo aumentaram, junto do medo/receio/temor de que algo de muito, muito ruim poderia estar reservado para o dia 16 de agosto, data da 2ª partida. Havia também a esperança de que não, dessa vez aquela sombra que teimava em nos perseguir desde sei lá quando, tinha sido deixada pra trás, quem sabe até mesmo no último clássico Gre-nal, naquele sofrível 1 a 1 que deu o título do Gauchão ao Grêmio.
O final de semana seguinte da vitória em São Paulo reservou-nos uma virada de 2 x 1 pra cima do Fortaleza pelo Brasileirão fora de casa, com o time absolutamente reserva. Os titulares retornaram a Porto Alegre tão logo tomaram uma ducha no Morumbi. Tudo voltava-se a mais importante batalha que o Internacional já havia disputado.
Na segunda-feira que antecedia a disputa, quem sabe de forma involuntária, para diminuir a pressão emocional que a atmosfera me exercia, sai para um bar que há muito não recebia a visita da minha pessoa, mas que já foi por diversas vezes, num passado razoavelmente distante, palco de noitadas soberbamente divertidas. Bebi ao ponto de tomar banhos de chuva numa fria madrugada acompanhado, veja só o acaso, por uma amiga torcedora do São Paulo. Não tive condições de ir ao trabalho na manhã seguinte, e isso era só o ínicio. Não havia cabeça para manter regras, disciplinas e condutas sensatas, tudo passava por quarta-feira, 16 de agosto. Parecia que a vida apenas poderia retomar o seu (devido?) curso após o jogo, fosse qual fosse o resultado. Nunca havia passado pressão parecida em termos futebolísticos. Nem mesmo quando a segundona nos acenava, nua e insinuante, como foi contra o Palmeiras e o Paysandu, em 99 e 03.
16 de agosto, 2006:
Frio, chuvisqueiro, umidade e outros defeitos climáticos reuniram-se na tão aguardada data. O dia em em si foi passado da mesma forma que os outros dias a pelo menos uma semana e meia atrás haviam sido; puro piloto-automático. Tomei duas cervejas 600ml antes do ínicio da partida, buscando uma maior tranqüilidade. Sei lá de onde retirei a idéia que um pouco de álcool poderia causar esse efeito. Meia hora antes do ínicio da partida fui agraciado pela visita do Mestre, cidadão que levei junto comigo ao Gigante em duas oportunidades, pessoa que posso, com um sorriso na face, dizer que tornei mais um de nossa Nação. Aproveitei para lhe mostrar certas fotos que possuía em meu HD, e cair numa onda nostálgica que me retirasse um pouco da tensão pré-jogo, que naquele instante estava beirando o insuportável. Os minutos passaram-se e eu sabia que o jogo logo teria ínicio. Passaram-se mais alguns minutos, sabia que a partida já estava transcorrendo, e ainda assim mantinha-me na frente do micro. Fosse possível e tivesse coragem, tomaria algum comprimido ou injeção que me fizesse cair em sonolência profunda até o término da partida. Mas não, era chegada a hora. Enfim deveríamos rumar para a casa de meus pais, para a TV 29’, para o mais importante jogo de nossa história. Desliguei o micro e disse ao Mestre que estava na hora de ganharmos a América. Abri a porta de casa quando a partida estava paralisada pela fumaça dos sinalizadores. A partir dali, foi uma linha ascendente em termos de nervosismo, e descendente em termos de racionalidade.
E o jogo? Não sei, necessito assisti-lo de novo, algo que ocorrerá possivelmente muito em breve com o advento dos DVD’s que surgirão. A partida em si, o desempenho das equipes, tudo passou batido. Não era um mero jogo, tratava-se da mais importante das batalhas, o ato final da guerra que havia iniciado na Venezuela, passado pelo México, Uruguai, Equador, Paraguai, pela mais importante cidade da América Latina, e voltado ali, para o lugar onde estava predestinada a ter o seu fim.
Vislumbrando tudo agora, com a perspectiva quem sabe mais correta que o tempo dá, reconheço que foi uma experiência transtornante. A impossibilidade de explicar ou até mesmo lembrar da sensação que tomou conta de mim após o empate do São Paulo, faltando 4 minutos e meio do tempo normal para acabar o jogo, demonstram ao o que, de fato, fui submetido: terror puro. Desses últimos minutos, lembro apenas da minha dúvida em ver ou não o que a partir dali ocorreria. Sem saber ao certo o que fazer, fechei o zíper de minha jaqueta vermelha até o máximo que ela permitia, e me trancafiei nela. E foi ali, fechado, com apenas os olhos e o nariz do lado de fora, que vi tudo que se passou até trilhar final do apito de Elizondo. E, por Deus, foi incrível. O fim da noite reservou a visita de Bija, de sua namorada e de meu irmão a minha mini-casa. Permaneci ajoelhado acionando o windows media player em alguns gols da campanha vitoriosa que haviam chegado até mim pela net. Haroldo de Souza e Pedro Ernesto Denardim embalaram o soundtrack até o instante que aumentei o volume da TV para assistir e ouvir ele, o predestinado, Fernandão, levantando a taça. Que cena, que imagem, que glória.
Os dois jogos finais representaram para min algo que ainda hoje, 20h09min de 06/09, não foram de todo digeridos. Minha disciplina para com inúmeras coisas foram literalmente deixados de lado e ainda não restabelecidas na sua integralidade. Felizmente, aquela sensação terrorista de receio e tensão elevados ao extremo já se desapareceram a dias. O que agora resta é uma ainda ressaca, um ainda desleixo. Parece que se aguarda uma espécie de virada de ano para botar tudo em ordem e seguir em frente. Porém agora, com uma estrela a mais no peito e a sensação de que algo pra lá de incrível eu tive o prazer de contemplar.