quarta-feira, março 24, 2021

EXTREMA-IMPRENSA

Bruna Frascolla faz um retrato perfeito da imprensa/mídia aqui. Nada caiu tanto em descrédito nos últimos tempos.

Ou o leitor engole essa conversa, ou então fica desconfiado da imprensa, e prefere se informar pelo zap-zap. Não é de admirar que a imprensa caia em descrédito. Mas os jornais, em vez de reverem a sua conduta, criam a figura da “agência de checagem de fatos”, que sempre vai concluir que tudo o que os opositores do progressismo dizem é fake news, e nada do que os progressistas dizem é fake news. Então não é de admirar que as “agências de checagem” não convençam ninguém fora da bolha progressista, que abarca a maioria da imprensa. Que fazem os jornalistas? Concluem que a plebe precisa de tutela estatal para determinar o que é a Verdade e censurar as fake news. Senão as pessoas votam do jeito que querem, e aí sim é que acaba a democracia.

Como os jornalistas se acostumaram à ideia de “agência de checagem de fatos”? Averiguar fatos é a função mais elementar do jornalismo. Antes das tais agências, existia simplesmente jornalismo, ou então sites especializados em desmentir boatos da internet, como o E-farsas. Desmentir boatos documentados é um propósito modesto e exequível. Mas determinar a verdade dos fatos é um empreendimento de complexidade variável: pode ser uma tarefa para gerações, executada por cientistas e historiadores que debaterão, debaterão e debaterão, sem parecer chegar a um acordo nunca.

segunda-feira, fevereiro 01, 2021

CORROSÃO


Nas próprias Humanidades, surge uma disposição contra a tradição e os great books, em nome de uma visão progressista na qual esses livros manifestariam as forças da opressão. Ainda estudam-se os grandes textos, mas sem um bom motivo para isso.

A tendência corrosiva do pós-modernismo: busca-se criar um conhecimento novo a partir da manifestação da própria superioridade diante dos autores antigos estudados, mas, assim, destroem o próprio objeto de estudo. Tudo o que resta é uma hermenêutica da suspeita e um jargão compreensível apenas para experts.

Trecho retirado de uma excelente resenha de Porque o Liberalismo Fracassou de Patrick Deneen. Ao que parece, a grande obra publicada no Brasil no ano passado e que num futuro por enquanto distante, há de ser lida por esse vivente.

quarta-feira, janeiro 27, 2021

COMO O DESTINO SE IMPÕEM SOBRE NÓS, INDEPENDENTE DA NOSSA VONTADE, E COMO DEVERÍAMOS ESTAR A ALTURA DOS DESAFIOS QUE SE APRESENTAM

E os anteriormente impensáveis, melhor, incogitáveis trezentos e sessenta e cinco dias sem um gole de álcool acabaram acontecendo. Um ano e sete dias, precisamente falando. A jornada findando simbolicamente num vinho seco em família na noite do meu aniversário.

Seria mentira afirmar que permanecer todo esse tempo sem beber foi algo complicado. Não foi tanto assim, pois haviam outras inúmeras coisas acontecendo que facilitaram a empreitada. Minha vida assumiu uma direção tão diferente nos últimos meses que é impossível fazer qualquer paralelo com outro instante anterior. Por isso, é máxima a certeza de que o contexto ajudou demais a realização da tarefa: uma criaturinha se materializou, uma epidemia surgiu e freou as idas e vindas, os instantes de ócio diminuíram brutalmente, as preocupações e os dramas não ficaram em nada menores, mas mudaram de terreno, plano, configuração. 

I realised that I would have to work on not drinking and my mental wellbeing every day of my life. Not drinking is good but it doesn’t magically cure everything. Life is not straight forward; it still can be difficult, and I work on my mental health on a daily basis. That still has a certain stigma, but I see it as normal and I embrace it. After all, if I exercise most days to maintain my physical fitness, where’s the problem with exercising the mental muscle every day to maintain my mental fitness?
OYNB.

E daqui em diante como vai ser? Não saberia dizer. Seria precipitado arriscar.
Acho que em situações onde um vinho, uma espumante ou uma cerveja surjam como prazeres a serem aproveitados/usufruídos, eu não deva frear o desejo, especialmente quando estiver acompanhado.
Mas confesso: simplesmente impossível não ambicionar uma vida sem álcool. O mal-estar posterior se torna uma sensação tão, mas tão dispensável que, livrar-se disso de uma vez por todas, não seria, de fato, nada ruim.

No mais, sigo incrédulo como tudo pode ter ganho contornos tão estranhos e diferentes num espaço tão curto de tempo. A ingerência das próprias escolhas contrastando com a aparente aleatoriedade caótica do Destino, em maiúscula. O resultado disso tem contornos profundos e ainda não compreendidos na sua totalidade.
Eis a Vida, em resumo, diriam.