quarta-feira, dezembro 30, 2009

DICTA

...foi nos EUA que ela (a internet) “explodiu” na década seguinte. Um elevado nível de alfabetização associado à presença da maioria dos computadores interconectados do planeta, esse foi o pressuposto para que, meio por geração espontânea, a internet desse à luz a blogosfera tão imprevisível e inesperadamente quanto a invenção de Gutemberg havia gerado aquilo que Hegel chamaria de “a oração matinal do homem moderno”, a imprensa escrita.
Nem com todos os elementos da hegemonia gramsciana espalhados, do pré-primário ao pós-doutoramento, pelo sistema educacional, dos grandes jornais e revistas aos folhetos do grêmio estudantil, pela imprensa e, com apoio da mídia, professados, do cineasta bilionário ao poeta marginal, pela maioria dos agentes culturais e artísticos, nem com tudo isso é possível, em última instância, obter-se um monopólio completo e perene de todas as caixas cranianas.
Que Reinaldo tenha encontrado no blogue seu veículo (e vice-versa) é uma sorte que, negada a Kraus, foi-lhe propiciada pelo Ocidente, pelo Iluminismo, pelo racionalismo, pela ciência, pela Revolução Industrial, pela economia de mercado (que ainda insistem em chamar de capitalismo), por inventores e empresários à procura de lucros e por outros tantos monstros reconhecidamente hediondos, malignos. Seu sucesso, todavia, como esse mais moderno de todos os arcaísmos – o livro – demonstra bem, decorre mesmo é da combinação de talento, trabalho duro e amor (correspondido) pela língua.


Nelson Ascher resenha na terceira edição da Dicta, O País dos Petralhas. Das melhores críticas literárias que já li.

DA FALTA QUE VOCÊ ME FAZ

Enquanto leio O Jogo da Amarelinha, de Cortázar, me deparo com um texto que soa como um recado:


Oliveira bebeu mais um mate. Tinha de cuidar da erva. Em Paris, custava quintos francos o quilo nas farmácias e tratava-se de uma erva perfeitamente asquerosa que a drogaria da estação Saint-Lazare vendia com a vistosa qualificação de “maté sauvage, cueilli par les indiens”, diurética, antibiótica e emoliente. Por sorte, um advogado de Rosário - que, a proposito, era seu irmão – tinha-lhe enviado cinco quilos de Cruz de Malta, mas já restava muito pouco. “Se a erva acabar, estou frito”, pensou Oliveira. “O meu único dialogo verdadeiro é com essa bebida verde.” Estudava o comportamento extraordinário do mate, a respiração da erva fragrantemente levantada pela água e que, com a sucção, desce até pousar sobre si mesma, perdido já todo o brilho e todo o perfurme a não ser que um pouco de água a estimule de novo, autêntico pulmão argentino de reserva para as pessoas solitárias e tristes.


Devem fazer cerca de duas semanas que a minha erva acabou. Cultivava esperança de que uma outra tripulante brasileira havia trazido, quem sabe algum outro cidadão da latino américa, mas nada. Sem perspectiva de comprar erva-mate em praias caribenhas ou mesmo nos EUA, tratei de comprar uma pequenina máquina de café e tentei, em vão, passar pela segurança do navio. Como tripulante estou impossibilitado de possuir um artefato desses na cabine. Confiscaram-na e agora só me resta sonhar com a mesma sorte do protagonista do paragrafo acima, de uma bem-aventurada alma enviar um pacote que seja.

domingo, novembro 08, 2009

DAS CORRIDAS

Após periodo nebuloso de desgraças fisicas, sem a possibilidade de realizar exercicio algum, e agora, trabalhando sob a água, sem a possibilidade de correr, se não numa esteira de uma iluminada por demais sala de um deck subterranêo da embarcação, me dispus a elencar os instantes divinos que a corrida, de muito bom grado, me proporcionou. Texto que agradará os adeptos, e causará irritação e constrangimento aos não chegados.
Pra matar a saudade, elenco os três maiores, de uma já interessante fortuna, dessa forma:

3. O sprint da Maratona de Punta del Este
Vislumbrar no horizonte o término da prova e constatar que o corpo ainda possui uma exigua cota de energia, o suficiente para lhe possibilitar acelerar, não especificamente acelerar, mas sair da constância do seu ritmo para um mais veloz. Eis a maravilha: enquanto os demais definhavam nos últimos kms, onde estradas de chão se misturavam com parcelas de asfalto, pude ultrapassar a linha de chegada como comumente se diz, “sobrando”.

2. A Maratona de SP e os seus últimos 4km's
São Paulo foi a maratona escolhida para 2009, em detrimento da capital gaúcha que, sem uma razão aceitavel e concebivel, realiza a sua maratona uma semana antes dos paulistas. Fui até lá e verifiquei o quão ardua se trata a maior prova desse tipo no país.
Do km 30 em diante, mais especificamente no instante em que se deixa pra trás a cidade universitária, teve inicio a tortuosa via-crucius que durou até o último metro dos 42,2km. Do km 38 em diante, trecho que inclui um túnel, aquela altura, letal para qualquer corredor, é o trecho que destaco para comentar: atravessa-lo, movido pelas últimas sobras de energia que o corpo reserva, sendo necessário um rigoroso controle dos movimentos das passadas e dos membros como um todo, numa espécie de rotação ideal, tal como um automovel exigiria, para que você não se visse abraçado, literalmente, pelas cãimbras, além da sensação de abafamento que o clima seco do meio-dia propiciava, tudo isso junto e somado e temos como rescaldo um feito a ser comemorado: a chegada, ainda que com suas demoradas 3h53min, sem paradas, ainda que nos últimos km em baixa velocidade. Um feito.

1. Parte final do penultimo trecho da Volta à Ilha
Por razão de obras em determinado local de Florianopolis, para que não houvesse nenhum ponto de troca e consequente acúmulo de pessoas nas imediações desse lugar, cerca de 12km de um trecho que seriam comumente dividido entre dois atletas, foram realizados por apenas um na prova de 2009. O trecho em si não trazia nenhuma dificuldade sobressalente, ao contrário, as dificuldades todas haviam sido transpostas nas areias, morros e lamaçais que antecederam-no. Não havia maior motivação entre ultrapassar esse ou aquele corredor, e o instante não propiciava quase nenhuma incidência de ânimo ou coisa do tipo. Por mais distantes que os demais corredores aparecessem no horizonte que se alongava o meu campo de visão na já noite catarinense, a velocidade que imprimia era suficientemente maior e a ultrapassagem ocorria de modo previsivel. Deviam faltar uns 5km pra entrega do bastão e o fim do meu trecho, quando noto pelo som que ecoava no asfalto, e depois pela sombra que a luz dos postes emitia, um corredor as minhas costas aproximando-se rapidamente e enfim, ao invés de continuar realizando ultrapassagens, a sofreria. Nada que importasse, nada que fizesse qualquer diferença, resumindo, não ocorreria NADA. Mas aí, eis o grande delirio da coisa toda, esse vazio todo ruiu e fui inflado dum desejo de superação sem tamanho. E o que ocorreu daquele instante, onde o cidadão se postou a pouco menos de 1 metro de distância de mim, até o desfecho de tudo, com a entrega do bastão e a exaustão sem limites, será algo que não hei de me esquecer. A auto-motivação incessante, proporcionada por um corpo em estado de extâse, inflado pelo quimicos naturais gerados por você próprio e eis o combustivel que me fez voar. Corri como nunca antes e, até então, como nunca mais ousei depois.
Findados os trechos todos, a beira-mar, após a linha de chegada, em meio a confraternizações e felicitações das equipes, entrega de medalhas e coisa do genero, tive a oportunidade de encarar o meu oponente naqueles - pra minha pessoa, históricos para todo o sempre - 5km. A ele, faltava-lhe emoção, não tinha desfrutrado do mesmo delirio, do mesmo “pega” que na minha mente haviamos travado. Cheguei até a cogitar que estava na posse de um espirito de competitividade exacerbado, devido a complacência dele ao me cumprimentar. Esperava uma resposta diferente, um xingamento que fosse, qualquer coisa, menos uma postura tão inerte frente ao emocionante duelo que, na minha cabeça, logicamente, haviamos acabado de realizar. Porém, como não há nada mais individual do que a corrida, a idéia do reconhecimento do adversário batido desapareceu em seguida. O que sobrou – o que sempre sobra quando se trata da idéia de correr - foram as sensações decorrentes tão somente da minha mente.
E deve ser por isso que eu gosto tanto e não raro costumo até superestimar esses instantes, elevando-os a uma condição sagrada. Algo que provavelmente em algum momento eu tenha feito ao longo desse texto.

sábado, outubro 03, 2009

DAS DOENÇAS CONTEMPORÂNEAS

Sexta, às 2:55 da manhã, aguardando um download acabar, para poder sair de casa.
17 minutes remaining diz o Mozilla. Que assim seja.

segunda-feira, setembro 21, 2009

REMÉDIOS PARA TODO MAL

Hoje todo mundo é deprimido. Se você tem uma tristeza, logo aparece alguém para aconselhar a tomar um remedinho para ficar bem, para não ficar ansioso. É a geração do Rivotril. É remédio para regular humor, combater tristeza, emagrecer. Uma vez tomei um emagrecedor e falei: gente, desculpa, mas isso é igual à cocaína. Primeiro, eu fiquei com palpitação no coração e, depois, meio deprimidinha. Fiquei sem fome e excitada e, depois, muito angustiada. Já vi isso antes, só que tinha outro nome: cocaína. Antigamente, todo mundo fazia análise, hoje a psicanálise perdeu para a psiquiatria. Todo mundo tem um psiquiatra, é bipolar, e toda criança é hiperativa. Impressionante. Deve haver outra maneira de resolver nossos problemas que não seja tomando remedinhos, né? Isso eu acho muito sinistro. Marca o nosso tempo.

Fernanda Torres, na Istoé.

sexta-feira, setembro 04, 2009

DO MEU RICO HD

Meu sonho, meu sonho mesmo, era encontrar alguém que tivesse sobrevivido a um furacão e não dissesse uma palavra sobre o furacão no diário. Voando pela sala, estendendo os braços para pegar o diário flutuante, o telhado subindo em espiral ao céu, ele escreveria: "Me sentindo meio deprimido hoje. Vou jogar pif-paf."

Soares Silva, de algum canto escuro e empoeirado do disco rígido.

quarta-feira, agosto 26, 2009

O E(LOGIO)-MAIL DO ANO

From: francesca-romani@******.com
To: leandrorizzi@******.com
Subject: "GALVIN"
Date: Wed, 26 Aug 2009 08:48:39

Quarta-feira, 9:15 da manhã, dia ensolarado e quente na capital. Enquanto os gatinhos tomam um sol gostoso na sala, eu estou no computador e a loirinha está no sofá. Ambas observando os mimis.


Natalia:
- Nossa, o amarelo é lindo. Ele é tão viril. O nome dele tem que ser Galvin. Ou Galvão. Ele é tão másculo. Ele é muito homem.

Francesca:
- HAHAHAHAHAHAHA! Meu deus, e como é que o Galvão não está aqui agora escutando isso????

Natalia:
- Olha a Greta Garbo. Está demonstrando felinamente que o Galvin deve possuí-la. Ela quer que o Galvin a possua. Até o miado do Galvão é mais grave. Ouve! A voz dele é mais forte! Ele é muito másculo.

terça-feira, agosto 25, 2009

SETH

PLAYBOY: So we die, the lights go off, our loved ones put us in a box, and our bodies begin to slowly disintegrate?
MacFARLANE: Right. It sucks. And it does seem like a cruel joke. Although there are people like Hitler, Stalin and Reagan who make you think, Well, maybe it’s for the best.

Como disse Joel Pinheiro, Family Guy é mesmo uma destruição integral de absolutamente todos os valores possíveis, para o bem ou para o mal. Seu criador, o ateu, liberal, democrata e dono de outras tantas desaconselháveis características, Seth McFarlane, foi entrevistado pela Playboy americana e o dialogo merece muito a leitura.

domingo, agosto 09, 2009

OBSCURESCÊNCIA

Julho foi a desgraça em forma de mês, no que tange a flagelos no meu corpo, dessa vez estritamente sob o aspecto FÍSICO da coisa. Lesão, feridas, e a impossibilidade de utilizar a si, conforme a vida te acostumou. Dificuldades impostas: dor e desconforto, tudo somado, e fica difícil deixar de vestir o surrado e sempre a mão, manto da obtusidade e da comiseração. Assim, sucumbir fica fácil e a um só pulo.

quinta-feira, julho 30, 2009

EU ESTOU ERRADO

É conhecido o suposto episódio em que Chesterton responde à pergunta que o jornal London Times fez a vários escritores: "O que há de errado com o mundo?". Sua resposta teria sido uma carta com o seguinte conteúdo:

Dear Sirs,

I am.

Sincerely yours,
G. K. Chesterton

Do supra-recomendado post de Julio Lemos.

quarta-feira, julho 29, 2009

DESLUMBRAMENTO SONORO

O ano tem sido tão pródigo em termos musicais que é temeroso por demais afirmar em pleno julho, que este JJ - n° 2 [Sincerely Yours, 2009] será o melhor álbum de 2009. Para o momento basta dizer apenas o que ele é: maravilhoso e brutalmente viciante.
A sensação de ouvir os seus modestíssimos (felizmente apenas em matéria de tamanho) 29 minutos no repeat, seguidas e mais seguidas vezes remete a uma ilusória percepção de que se trata de um álbum com horas de duração. A primeira audição é diferente da segunda e assim por conseguinte, até cansar. As informações sobre o grupo suéco são envoltas em um mistério nada involuntário, e bastante pouco sabe-se acerca deles. Soma-se a isso a dificuldade em conseguir indicar o gênero musical correto e que melhor definiria o som produzido pelo JJ. Uma miscêlanea, uma pluralidade de impressionar.

Uma música em especial, From Africa to Málaga, me fez lembrar - não obstante as sonoridades absolutamente distintas - do épico cd Night Falls Over Kortedala de Jens Lekman, do finzinho de 2007. Desde lá, não topava com um álbum que me remetesse tão firmemente a uma atmosfera de felicidade, na acepção literal do termo, como esse Nº2.

Abrimos aspas para o Obscure Sound, que no seu review diz:
When one combines the lush but ardent vocal performances of JJ with each and every song’s grace and beauty, it results in an album that will undoubtedly receive praise as one of the most accomplished electronic releases of the year.

Aspas também pra Pitchfork:
They’re as naive as they are cynical– or is it the other stupid way around?– and they manage to be pretty, touching, funny, and motivating, in different ways, in all the right places, for nine songs lasting 28 minutes.

Aspas pro e-mail que Ari Jr me envia de terras lusitanas após uma mui singela sugestão para que ele realizasse o download da obra:
Viciante o sonzinho do JJ. Já toquei uma dezena de vezes o álbum.

Nesse mesmo link da Obscure Sound, há um comentário de um leitor que explicita magnificamente bem o FEITIÇO que se acometeu sobre mim. Pedindo licença, parafraseamos o autor:
Can´t stop listening to Nº2, great album!

Um êxtase sonoro, um deslumbramento auditivo como só a (boa) música é capaz de proporcionar.

segunda-feira, julho 20, 2009

ENERGIA SOBRESSALENTE

...a teoria de que nossa performance durante o exercício é regulada por um sistema inteligente que impede nosso organismo de exercitar-se em níveis que possam trazer consequências sérias ao nosso corpo e, por isso, sempre existe uma "reserva" de energia que não é utilizada em situações normais. Esta teoria difere do pensamento tradicional, que propõe que o exercício é sempre limitado pela "falência" de algum sistema em gerar energia em níveis adequados.

Uma das minhas fortes crenças sendo tratada de forma séria na Contra-Relógio deste mês, e também servindo de alerta ao blogger de que ainda há vida nesse blog, por mais que o espaço-tempo entre os posts esteja sendo digno de represálias.

quarta-feira, junho 17, 2009

COMPREENSÃO MÚTUA

"All men may not be brothers, but that's the way it feels after a marathon. You feel - you can't help but feel - that you all understand each other."

É isso. É exatamente isso, Ben Cheever.

terça-feira, junho 16, 2009

DAS TREVAS

A depressão - essa gosma densa e negra do desalento - estava longe de ser uma novidade na minha vida. Desde a infância vinha batalhando contra ela, como se ao sair do ventre me tivessem envolvido num cobertor cinzento e áspero, em vez da manta de algodão macio, em tom pastel. Não acho que tenha sido um bebê triste, a julgar pelas fotos em que apareço com um ar moleque, os olhos brilhantes e sorriso aberto. Ainda assim, quem sabe se já não estava adotando a máscara de bem-estar que todo deprimido aprende a usar para poder navegar pelo mundo?

Uma pergunta sempre me intrigou: como era possível que ninguém fosse capaz de adivinhar esses terríveis desdobramentos só de olhar para você? É enfurecedor constatar que a depressão grave, por mais que seja tratada como uma doença, não emite sinais claros que os outros consigam captar.
A dor psicológica é terrível, mas não tem como ser provada, não há feridas abertas vertendo sangue. Seria tão simples se você pudesse engessar a mente, como se fosse um tornozelo quebrado, provocando murmúrios de solidariedade que substituiriam o ceticismo ("Você não pode estar se sentindo tão mal assim...") e, em alguns casos, a hostilidade declarada ("Talvez se parasse de pensar o tempo todo só em você...").


Daphne Merkin e os seus relatos de congelar a espinha acerca do monstro chamado depressão. Negritos por minha conta. Leitura integral no site da Piauí.

quarta-feira, junho 03, 2009

MARATONA DE SP

A síntese desse post seria algo como foi, até aqui, a prova mais dura que encontrei pela frente. Não é exagero, tão pouco superestimar algo. As maratonas anteriores, os revezamentos, nada, nada mesmo, foi tão severo como os 42km do último domingo.

A maratona, seja onde for, é difícil por si só, mas o percurso da capital paulista reúne especificidades que engrandecem o tamanho do problema e comprometem por demais qualquer tentativa de uma boa performance. Os trechos de aclive e declive dos túneis são arruinantes, e um túnel em especial, próximo do quilometro 40, é a visão do inferno pro corredor que se aproxima. Você, já exorcizando os demônios, controlando câimbras, tentando manter a estabilidade das passadas, sugando todo ar possível a sua volta, enfim, lidando com um corpo aos frangalhos e aguardando apenas pelo pórtico que indica o término da corrida, se depara com a escuridão de mais um trecho subterrâneo e a inerente dificuldade da descida no instante da entrada e, fundamentalmente, a subida na hora da sua saída. Houveram ainda algumas regiões de campo aberto em meio ao asfalto que foram zonas onde um forte vento contra reinou absoluto, sem contar o clima seco e em certos pontos abafado. E claro, o nefasto horário de largada às nove da manhã. Atingi a linha de chegada quando o relógio marcava meio dia e quarenta e poucos, finalizando a prova num almejado tempo sub 4h: 3h52min.
Interessante ressaltar que a preparação dessa vez não foi maior nem menor do que nas oportunidades passadas, embora reconheça que não aguardava pelo tamanho da pedreira que me foi imposta.

Ao término de tudo, já sentado na graminha do Ibirapuera devorando o habitual lanche servido pela organização no pós-prova, a comprovação que poucas experiências são tão recompensadoras e dotadas de sentidos e significados individuais tão especiais como a conclusão de uma maratona. O cansaço era grotesco, mas a satisfação sobrepujava-se enormemente. Tem sido assim, e é isso que me move pra fora de casa a treinar horas e horas por semana para reunir o condicionamento suficiente para a sempre hercúlea tarefa.

Pouco depois o destino tratou de interceder, o acaso deu o ar da sua graça e, quase sem querer, consegui pegar uma carona com um corredor ali mesmo, para instantes depois ser deixado a 100m do Morumbi. A tarde ainda me reservava a pelada entre São Paulo e Cruzeiro, mas isso não é assunto pra agora.

Domingão de luxo.

* A foto é da webrun.com.br.

quarta-feira, maio 20, 2009

DISSOLVER-SE

O que eu quero é o breu da noite como condição, como algo no qual eu possa afundar e me dissolver; o que eu quero é que a escuridão se infiltre nos meus olhos e que o meu corpo saia flutuando para que deixe de ser tão nítido, ou tão importante quanto ele me costuma parecer, a ponto de, devo admitir, eu me pegar escutando os seus sinais como um monomaníaco ou um hipocondríaco; o que eu quero é dissolver um pouquinho a fronteira entre corpo e não-corpo, talvez consumar uma tênue osmose ali onde começa um e termina o outro; borrar. É o que eu quero quando estou farto de mim mesmo, do meu rosto no espelho, das palavras que ponho na tela, farto do gosto metálico que sinto na boca ao me representar dia após dia, quando a relação proporcional entre eu e eu é de 1:1, só que não exatamente, e o asco e o desdém por mim mesmo vazam pelas fissuras na borda, ali onde a discrepância impede que a fita adesiva da vida grude como deveria.

Per Petterson, daqui.

terça-feira, maio 19, 2009

BENEDETTI

Tinha um post engatilhado desde término de fevereiro sobre A Trégua, um pequeno grande livro de pouco mais de 150 páginas que narra o envolvimento de um velho próximo da sua aposentadoria com uma colega de muitíssima inferior idade. O livro é triste. Ao menos a minha leitura, a absorção do texto, ocorreu dessa forma. As passagens em que o velho demonstrava não ter conseguido digerir a morte da sua esposa são parágrafos tão valiosos quanto aniquilantes. Impossível sair ileso da leitura dessa obra, e um misto de preguiça e procrastinação impediram a publicação dos almejados relatos. Hoje, a notícia infeliz que cabe ser dada, até como uma espécie de homenagem, é a do falecimento do seu autor.
O uruguaio Mario Benedetti morreu no último domingo. Do seu retrato escorre e é nítida a impressão de que se tratava duma formidável criatura:

1921 - 2009

segunda-feira, maio 04, 2009

O RETRATO DO CINEMA COMO LIXO

É o sub-produto perfeito para ilustrar o denominador comum de um tipo de cinema atual feito para vender pipoca, balinha, nachos e refrigerante, para um público com cera nos ouvidos e limite programado de atenção de não mais do que quatro segundos.

Não raro assisto a filmes reconhecidamente ruins do gênero de super-heróis, motivado por aquela curiosidade intrínseca a qualquer fã de comics que continua ou não lendo HQ's. Fiz o download da versão ainda não integralmente finalizada de X-Men Origins - Wolverine em nome de algum dos 3 filmes dos X-Men lançados a alguns anos atrás. Não lembro qual, mas ao menos um deles me agradou bastante e havia um resquicio de fé na hipótese desse efeito se repetir. Mas claro, isso não aconteceu. Dessa vez, extravasaram no erro. Kleber Mendonça é o dono do comentário em itálico acima, tirado daqui, e que ilustra magnificamente o pior filme que assisti nesse 2009. Após ver Pink Panther, com Steve Martin, e How to Lose Friends and Alienate People, uma bomba que eu julgava insuperável, nem nos piores pesadelos imaginava poder ser exposto a alguma obra de qualidade ainda mais rasteira num período tão breve de tempo. A 20th Century Fox surpreende, e me mostra que o fundo do poço é um pouco mais adiante.

quarta-feira, abril 22, 2009

O ADULTÉRIO COMO ESTÍMULO

"O que estimula todos os nossos avanços tecnológicos é o adultério: criou-se a internet, o celular, criaram-se as mensagens por telefone unicamente para que todos os casais possam viver com facilidade as suas vidas paralelas. (...) Está tão minado o terreno da fidelidade que a questão, para os casais, não mais é saber se o outro o trai mas sim com quem o outro o trai.".

David Foenkinos, no seu Em Caso de Felicidade, daqui.

quinta-feira, abril 16, 2009

A MENINA MÁ

Travessuras da Menina Má, de Vargas Llosa é, desde já, a melhor leitura que realizei nesse ano. Comprado de forma precipitada numa Feira do Livro de anos atrás, logo que a editora Alfaguara chegou ao Brasil, mantive-o adquirindo poeira na estante pois não nutria nenhuma esperança de nele encontrar algo que me fizesse, por exemplo, dispensar a ele esse post. Ledo engano. Não fosse a preguiça, deveria trazer até aqui, ou mais propriamente ao blog de trechos, alguns parágrafos brilhantes encontrados nas pouco mais de suas 300 páginas. Posso com segurança afirmar que não havia me deparado antes com uma uma obra que contasse com tantos trechos que me dispensassem uma torrente de sensações da mais pura excitação. Coisas visceralmente sexuais, que me obrigavam a respirar fundo e lidar com uma ereção que irremediavelmente surgia. Uma delicia, lógico, mas algo também inusitado, reconheço.
Mas não só os trechos de cunho sexual, a história melindrosa de idas e vindas e o desfecho formidável com que o autor peruano finalizou uma obra que, aparentemente, traz muito de autobiográfico (não que isso possua importância, não possui), fazem de Travessuras da Menina Má uma das mais preciosas peças da minha estante, uma das melhores experiências literárias que já tive.

terça-feira, abril 14, 2009

DO SUICÍDIO

Costumo explicar a tal pessoa que os pacientes repetidamente me contam como estão felizes pelo fato de não terem conseguido matar-se. Semanas, meses, anos mais tarde, dizem-me eles, descobriram que havia uma solução para seus problemas, uma resposta a sua pergunta, um sentido para suas vidas. "Mesmo que a chance de que as coisas melhorem seja apenas uma em mil" continua minha explicação, "quem pode garantir que no seu caso isso não acontecerá, mais cedo ou mais tarde? Mas em primeiro lugar você tem que viver para enxergar o dia em que isto pode acontecer, precisa sobreviver para ver nascer aquele dia, e, de agora em diante, a responsabilidade da sobrevivência não o deixará mais."

Viktor Frankl, do seu Em Busca de Sentido, iluminando tudo.

sábado, março 28, 2009

CHAOS

Hora de juntar os cacos.

quarta-feira, março 25, 2009

KEEP ON TRYING

Novamente, acho que não me fiz entender. É o menor dos pecados: deveríamos nos ajoelhar em agradecimento à nossa cotidiana incapacidade de expressar com precisão o que queremos dizer, seja numa conversa, num texto ou numa fotografia. Pois é justamente essa inexatidão que nos move a continuar tentando, rumo a um novo ponto de desconforto, e a outro, e a um próximo, na mais ou menos longa sequência de fracassos que reconheceremos como a nossa vida – quando terminar.

Cuenca, aniquilando tudo.

terça-feira, março 24, 2009

DOS DIÁLOGOS NOSTÁLGICOS

Lucho says:
mesmo assim das arquibancadas ouvirás o grito do fanático numero um de sua pessoa.... "VAMOS LÁ LELE"

Leandro says:

sim, o grito que já ouvi uma vez. Em rock and rio, vc me excitando a ir lá dar uma bimba naquela bola
imensa de plástico

Lucho says:

AFFFFFF
belas recordacoes desse momentooooo
destruiu a diversao de variosss

Leandro says:

destrui a de vários e arruinei totalmente com a minha
por alguns segundos, até irmos até o chuveiro bizarro que havia lá

Lucho says:

sim sim era notável seu desconsolo pela perda da bola, mas logo logo continuou o vandalismo no meio da multidao

SÍNTESE DO SONGBIRD

FMC says:
não dá. já vou desinstalar
pesado, com skin própria tipo as bostas desses programas da apple
o aero do vista dá um banho nessas skins e nego ainda inventa isso pra deixar pesado

Leandro says:

to aqui com um ar de NOJO mexendo nele
contagem regressiva pra desinstalação

terça-feira, março 17, 2009

PROPÍCIO

“Meus pobres nervos! Está chovendo muito. Volto a ler Exupéry. Fiz 36 anos e nao aconteceu nada. Queria sentir uma mudança qualquer em mim. Uma ruga a mais, por exemplo. Uma coisa nova, bem que fosse de velhice.

Que Deus me dê tranqüilidade. Agora, quem me poderia tirar da depressão que estou sentindo? Que parente? Que amigo? E tenho a impressão de que seria fácil melhorar-me. Bastava que alguém me garantisse uma solidariedade incondicional – assim como um pai. Alguém que fosse mais forte do que eu”.

De Antonio Maria, daqui.

sexta-feira, fevereiro 27, 2009

LIÇÕES DA NATUREZA

A blitzkrieg implementada pelos mosquitos na noite do último domingo num município de nome incerto, quase as margens da BR 101, ainda hoje me desencadeia coceiras. Não imaginava que picadas desses insetos produzissem um efeito retardatário tão grande.
Sugeriria a não compra do repelente utilizado, isso se me lembrasse do nome.

segunda-feira, fevereiro 23, 2009

APRESSADAS CONSIDERAÇÕES

As coisas andam meio paradas por aqui. Atualizações mais freqüentes ocorrendo nesse outro sítio.
Final de semana de carnaval regado a cerveja, bailes e eco-aventuras.
Kate Winslet ganhou o Oscar, e isso me alegra. Realmente me alegra.

Muita inveja do rapazinho aí, dona Winslet.

quinta-feira, fevereiro 12, 2009

MEU XARÁ

Uma das pessoas com quem mais simpatizei na recente visita ao Uruguai além de ter o meu nome, é um cidadão aprazível, querido, e que possui um histórico - uma bagagem, melhor - que nos proporcionava assuntos dos mais agradáveis nos diálogos travados nos chuvosos dias que encaramos por lá. Esbaforido e me recuperando da tarefa recém concluída, assisti ele chegar ao término da maratona de Punta em horário inferior às 4h que tanto lhe amedrontavam. Cumpriu com a tarefa que ele havia lhe imposto de forma quase que miraculosa, ultrapassando a linha de chegada em 3h e 58 ou 59 minutos, não me lembro bem.
E enfim, hoje pela manhã fico sabendo que ele teve uma perna amputada quando um ônibus colidiu na sua bicicleta. Em razão de exercícios físicos, o que é pior, não por necessidade de deslocamento. Sua vida corre risco, está no pronto-socorro ou UTI, agradeço por não ter muita familiaridade com essas siglas e nomes.
O dia correu de forma diferente, mais nebuloso desde que fui informado do ocorrido. Penso na lástima enorme que é. Recordo-me do quanto concordava com ele quando o assunto relacionava-se aos problemas relacionados ao fumo, não propriamente do cigarro. Dizia e ouvia mais ou menos o que eu pensava, e isso não era ruim, não tratava-se de em comunhão abraçar-mos uma mentira ou uma verdade, travamos de se reconfortar. Concordava firmemente com o que era tido como fato-consumado, tinha uma mesma visão da merda que isso é.
Este post é mais do que uma lembrança, são preces de que tudo corra bem com ele.

quarta-feira, fevereiro 11, 2009

A TRAVESSIA

O sucesso de ao menos um banho de mar nesse verão, passa irremediavelmente pelo clima estar ok nesse final de semana que se aproxima. O sábado trará a minha primeira participação numa prova em 2009 e, pela primeira vez, na categoria composta. 88km revezados em 8 pessoas num trajeto regado tão somente pela precária paisagem do litoral norte gaúcho. Uma boa oportunidade para uma salutar socialização e um ato de reaproximação com o astro-rei.

segunda-feira, fevereiro 02, 2009

POLADROID

Frases como a vida é um eterno recomeço ganham forte sentido em horários avançados da noite, com temperatura fria e solidão.
Frases piegas e carregadas de intensa carga emocional então, nem se fala.

Abaixo um dos últimos retratos de 2008, dando saudações ao 2009 que agora já se vê subtraído de um mês.

Um retrato na recente empreitada em duas rodas, que cerrou 2008 e foi citada no post anterior e que, salvo situações que evidenciem pagamento de pecados, de forma alguma eu recomendaria.