sexta-feira, junho 19, 2020

DAS VIRTUDES DA PASSIVIDADE

Falei que eu, pelo contrário, tinha passado a acreditar cada vez mais nas virtudes da passividade, e em levar uma vida o menos contaminada possível pela vontade. Podia-se fazer quase qualquer coisa acontecer tentando com afinco suficiente, mas tentar —assim me parecia —era quase sempre um sinal de que a pessoa estava atravessando as correntezas, forçando os acontecimentos numa direção em que eles não queriam ir naturalmente, e embora fosse possível argumentar que nada nunca podia ser realizado sem contrariar em alguma medida a natureza, eu havia —para ser bem direta —passado a odiar o caráter artificial dessa visão e as suas consequências. Havia uma diferença grande, falei, entre as coisas que eu queria e as que pelo visto podia ter, e até que eu tivesse de uma vez por todas me conciliado com esse fato decidira não querer absolutamente nada.

Rachel Cusch em Esboço